quinta-feira, 5 de maio de 2011

Das Quantidades

Pois quando então sentires teu espaço
taciturno e sombrio
estica o braço, e tudo que houver dentro
será menos vazio:

Alonga estes teus braços! Vai a oeste!
Vai a leste também!
E deixa que eles errem no infinito
para o além do além.

Transpassa o horizonte, o azul, as pretas
matérias dos espaços!
Dedilha, por Andrômeda, planetas
dedica-os teus abraços!

Distende! Deixa o toque vigoroso
sentir o que inexiste...
E perde-te no desconhecimento
daquilo que te existe.

Volta! Vem escrever dos inescritos
e não sabidos astros.
E considera a ti, nos teus escritos:
te reconhece vasto!

Volta contigo dentro. Traz também
o braço longo e estranho,
a pequenez, e tu, como voltasse
para o mesmo tamanho.

O Esteta

Vieram me contar que sou esteta,
passadista e barbudo.
De fecho éclair nos lábios,
as vozes dos livros abriam
as bocas de Augusto;
do Rosinha;
seu Camões...
mas só pensava, eu, nos limões
derramados
por sobre minha única
e aparente identidade.

Já me desistindo
pulei no lixo,
lambi uma puta inteira,

– cortesã... pensaria outrora. Aliás
até Outrora pensaria outrora –


cheirei um gato morto,
e comprei um barbeador.

Voltei. Sou esteta!
Fiz da barba o charme
e do barbeador
um verso sujo.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Pobre Imensidão

E houve o Big Bang... e houve o universo...
as estrelas, o sol, as supernovas
Andrômeda, vizinha destes versos,
rege os planetas como eu giro as trovas:

uma calcula os países:
– eis que são mais que duzentos!
das ilhas, uma outra conta:
– noves fora. é oitocentos!


E houve pessoas, mar, rios diversos...
(a imensidão – que é cada – mais comprova
sua impressão de infinda quando imerso
é o finito nas coisas que a renovam)

e voltando àquelas trovas:
– os sete mares reboam!
uma última arremata:
– há seis bilhões de pessoas!


Houve! E haverá bem mais(!) em cada cada;
centenas de países, gentarada
na lei da imensidão: crescer, crescer!...

E dentre o crescimento mais fecundo
e bilhões de pessoas deste mundo
parece eu precisar só de você...

terça-feira, 12 de abril de 2011

Na Aurora do Amor

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 "Quando nasce, o amor, em si,
renasce, pois, nas coisas;
e as cores são cirandas..." – Osvaldo Fernandes

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Um grilo bóia na água
e prata é verde musgo.
Há gavião nefando
invisível na sombra.

– Um sapo sai voando?

A arcaria de cores
pro céu, vai-se, lançando...

o céu chora... pras flores

Escondida entre as nuvens
(nas almofadas alvas)
trabalha a Estrela d’alva
e o branco agora é brilho!

e ouve-se um estribilho:

Asas de borboletas
ruflando, outrora pretas,
trazem mil coloridos
ao dia que desperta.

e tudo é luz e cor...

Pela janela aberta
pousando em nossas íris,
roubando, do arco-íris,
um vermelho de amor...

e ouvem-se mais canções:

São borboletas, grilos;
são sapos, gaviões,
que outrora eram só cores,
e agora... corações...

quarta-feira, 30 de março de 2011

A Lua e Eu

Conversando com a Lua
pus-me à rua,
pus-me à rua silenciosa.
Entreguei-lhe o que me amua
como sua,
como sua melhor prosa.

Tal corisco na caligem
vem, me inflige,
vem, me inflige um frio morno.
Seu sorriso me dirige
na fuligem,
na fuligem de um adorno.

Conto-lhe as mágoas, anseios,
devaneios,
devaneios mais dantescos.
Deixo o mundo, titubeio
no seu seio,
no seu seio gigantesco.

De manhã vejo o desleixo
quando a deixo,
quando a deixo e vou-me embora.
Como em todos os desfechos
que me queixo,
que me queixo ter memória.

Eis que a noite, n’outro dia
bem mais fria,
bem mais fria então me prova:
Lua negra, em agonia;
tão vazia!
Tão vazia... a Lua Nova.

Tão mais nova que os amores;
dos horrores,
dos horrores que explanei.
Passam luas, noites, dores,
mas as Flores,
mas as Flores... eu não sei!

domingo, 27 de março de 2011

É Tempo

É tempo, vem, ó meu amor, agora
que tudo é nuvem, vem, de amor volante,
(o céu parece um timpanão troante)
Que a chuva cai sem que se saiba a hora.

Vem que te espero apenas neste instante
(um tom maior por todo anil vigora)
Vem que o teu pouso o meu regaço implora!;
Que o timpanão do céu te tange ovante!

Vem logo! O céu, Amor, ficando escuro
querer, parece, te afastar do chão
o mesmo chão de terra e sonhos puros!

Pousa. Beija-me! E veem-se então centelhas
um relâmpago ávido se esguelha
e estoura um som maior que do trovão!

quinta-feira, 24 de março de 2011

Canto Choroso

O telefone toca. Lá na praia
põe-se a correr, enfim, pro último abraço.
Tropeça o coração, pulsa à cambraia
translúcido terror em cada passo.

Toma na mão, nos braços e desmaia.
Subverte a própria alma de cansaço.
Deita seu filho morto ao colo e ensaia
o mais choroso canto de um regaço.

– Por que meu filho (ainda enlouquecida)
levaste, Ó Mar? Por que levas as vidas?
Por que do que há mais belo Tu me privas?

Só o silêncio respondia, quando
ouviu-se lá do mar, rumorejando
dum marejante canto, uma água-viva!...

Das Distâncias Das Almas

Não te dispersas de tu’alma.
Deixa-a junto,
mas não muito perto
pois que, se distante
sobra-te o perigo;
próxima demais,
doença...

Sobreviventes

Não há sobreviventes sem adeus.
Os que ciclos trincam, seguem
na linha tortuosa.
E o adeus vira vinco;
e em cada vinco,
fica uma história
sobre viventes...

terça-feira, 15 de março de 2011

O Que Me És

És para mim, como num céu viçando
suas luas que me banham comichosas
a quinta fase: escura e luminosa;
amorfa , sensual, sem onde ou quando.

És mais do que pra mim: sou eu sanando
ao ritmo musical de mil felosas
que aterrissam cantando sobre as rosas;
os ninhos; sob a lua, afim, cantando...

És para mim, e inteiramente és
tal como a terça parte do equilíbrio;
um corpanzil plumoso de um anfíbio;
o céu telúrico onde eu calco pés!

Tu és(!), mas só pra mim – pobre poeta
régulo excelso das terras do bardo
parido em flor mas do Lácio bastardo –
a transcriação a que cultua o esteta!

Tu és a impressão imaginária
porque se vais ainda que não vás;
porque me ficas mais do que estarás
nas minhas noites mais que solitárias...

Em qualquer tempo me és enluarada!
Não mínguas, não és cheia, não és nova,
Mas enquanto houver céu, haverá a prova
crescente que em meu céu há mais que nada!

Sapatos Velhos

O sapato velho
da sola furada
fez descolar...
o caminho.

Da Dor

A dor é alarido de minh’alma
chamando a mente a animação do corpo.
Chamando aquele eu representado
nos monstros que me acordam de repente
e com suas garras, mil momices, dentes,
fazem medrar a morte em cada instante.

A dor é outro eu, mais dominante,
a revolta do ar contra o que inspira:
desfraldado na mente adentro a testa,
uma enxaqueca d’alma, o triste em festa,
é exacerbação desafinada
da mais suave e temerosa lira
ouvida por um lídimo Pierrô.

A dor é outro Osvaldo e eu, sou nada,
mas nada que me fira é mesmo dor...

sábado, 12 de março de 2011

Do Novo Brilho

Quero contar do brilho de improviso:
o mais puro e o mais liso; dos reflexos
nos olhos e na boca, desconexos,
cristalizados pelo teu sorriso...

Quero contar das asas, do voejo,
de ser o mais liberto e se perder
no aroma de uma flor azul-bebê,
que brota ao ar, esguio de desejo...

Eu sei falar das flores mas da Flor
eis a verdade: eu prefiro cheirá-la;
roubar dos olhos tenros que apunhala
de forma lacerante, um novo amor.

Eu sei falar das luzes de um olhar:
improviso sutil duma paixão;
mas quero só mirar-te o coração
que a tudo sente e fala... sem calar...

(E meus olhos, então,
perdido aos teus
que é céu, te refletir,
brilhar, brilhar...)

quinta-feira, 10 de março de 2011

J'ai Perdu

Il fut un temps
au beau milieu de l'Amour.
Et au milieu de l'amour
il fut un temps.

J'ai perdu du temps
aimer l'amour...
et l'amour;
aimer le temps!...

terça-feira, 8 de março de 2011

Soçobro

Soçobro
porque sobro e não me espalho.
Como espantalho dobro minha inércia
que cobra a beça à vida o sofrimento.

Soçobra o nauta
transformado em pedra.

Se pauta uma certeza é porque quebra
e cada febra emerge à maré alta:
é todo o nada negro num momento;
é mar inteiro, essência... e movimento..

Gás Nobre

És um gás nobre.
Não vejo a coroa
não chamo princesa
ou rainha.
Duquesa? Até poderia
mas és só um gás,
e gases dissipam
enquanto fico eu
com a mão no invisível
e o peito referto
de toda tua nobreza...

Relógio

Discuto com o relógio os tiques – brados:
que giro tão fugaz? Quantos invernos,
passariam por mim, se confiado,
dos gélidos, o gelo mais superno?

Mensuras meu calor quando eu hiberno!...
servindo-se dos mares mais pesados
ardores, que jamais, em mil infernos,
teria um tsunami de pecados!

Se todo o calor vivo é um lucivéu
postando-se supremo pelo céu,
que queres mensurar do sol, instância?

Tentas medir-me se estou acordado,
porém, do tempo quente ou do gelado,
só quem pode medir é minha ânsia!

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Liquefeita

Ela é assim,
imponente e líquida.
Vem vindo, vem vindo...
E tudo quanto a ela quero findo;
e quando quero muito nosso fim,
empurro o que há em mim com tanta força
e vejo que sou só cólera lassa...
pois quanto mais a empurro
mais ela transpassa...

Partiu-se-me

Partiu.
Não sei que idade eu tinha.
Se 18 ou mais.

Partiu. Deixou-me atrás
das tortuosas linhas.

Da senda que partiu
eu não vivi;
sequer andei,
mas inda ouço suas pegadas;
inda vejo-o misturar-se,
às flores dos atalhos.

Não sabe dos espinhos.
Não sei bem seus caminhos,
por onde andou, não sei
ou mesmo o quanto andado.

Mas sei quando partiu:
se para, eu sobrevivo;
se vive... estou parado...

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Retirante da Alma

Os Retirantes - Cândido Portinari

Tão cândido o sertão pra mim parece
Quando não calco os ossos da penúria,
E não ouço louvarem nas alturas
Os urubus à minha carne, em prece.

Não quero este sertão, nem me apetece,
Sentir deste temor, da vida dura,
Porque destas imagens de pintura
Nada mais que pintura se oferece.

Os seres cadavéricos que fito
Num tom meio sombrio – são só cores
mescladas por uma alma angustiante...

Que nem mesmo – confesso – fico aflito...
É que, por sorte, a todos os horrores
desta alma em que nasci, fui retirante!

Baú de Despejos

(a Reinaldo Luciano)

Fui saciar, no sebo, um dos meus vícios:
de ler, e me aprazer – me traz alento.
Achei perdido e rofo, no interstício,
um papiro amassado e poeirento...

Rutilava! Minh'alma o refletia.
Mal sabia: era a luz da sapiência.
Quão belo o manuscrito em poesia
feita em versos de mera competência!

Tirei-o do baú onde o encontrei
Li cada verso! Como os degustei
tal Rei da poesia a olhos nus:

A lira dum espírito doirado
qual parecia o Nume despejado
ou talvez fosse o próprio, no Baú!...

Ânsia de Amar

Numa ânsia de se amar sem limiar
o ser humano perde sua visão.
De mãos cheias na pá da piração
enterra a vida, cego e tumular!

Os olhos vão-se em ânsia e dispersão,
como se vão as mãos d'alma a apalpar
por vezes, o que nunca estará lá:
o grão do amor lavrado em solo são!

A ânsia de se amar nasce do Ego:
patrão dos olhos, iludidos, cegos;
nascente das suas gotas mais salgadas!

Mas se, caso ansiando o amor, me pego
choro o choro mais doce se o não nego;
lavro a melhor semente já plantada!...

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Teu Homem Perfeito

Um homem que te ame, que te adore
Que a sirva numa louça de Veneza
Um homem que enalteça tua beleza
Que por ti ria, grite, e também chore!

Um homem que não há na Natureza;
que mais pareça conto de folclore!...
que só por lhe sorrires comemore;
se vanglorie em ter uma princesa!...

Amar um homem, tê-lo por inteiro!
É o que mulher deseja em tempo infindo;
Charmoso, inteligente, rico... lindo!

Terá do amor supremo e verdadeiro
tal homem que há de amar-te. Todavia
se nunca o amares... tu? Nem por um dia!

Longe, Longe...

Vives fora, longe...
longe...
onde um monge não medita;
onde o sol lhe traz mais cor
onde o toque se acredita
longe, longe!
Vives fora! Ó minha Flor.

Lá as flores não tremulam
cada nuvem se há pausada!
Mas a tua voz airada,
diamantes, quando ululas
sinto e vejo
longe, longe,
minha Flor.

Acolá, tão longe...
longe...
Há meu céu, o novo tempo;
há, por entre ventos, Vento,
que barganho com a aurora
pois lá fora,
longe, longe,
a distância é mais que a hora,
e o presente
é minha Flor.

Mais presente é ter o Vento,
“– Ó meu Vento ide longe,
longe, longe!
Guiai-me no céu, no lume:
esta Flor; e justaponde
teu perfume em meu perfume!
Transportai-me teus pedaços!”
pois que ter de ti o abraço,
longe, longe
só no tempo
em que o Vento
for o Amor...

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Fomentação

Criou-se desta orelha qual ungiste:
recordações em mim que – mal passadas –
tomaram vida, decolando aladas
de inconsciência rude que brandiste.

E alado um tempo, uma paixão, um chiste,
uma razão de ser, voando, aladas
trouxeram-me de volta, ruminadas
reminiscências da paixão mais triste!

E criou-se, desta orelha, fomentando,
a mais excelsa e suave cantoria
que possa o amor furtar da cotovia!

Criou-se!... E em mim o amor, criou-se, quando
levaste, das orelhas, tuas mãos
e sotrancaste nelas tua canção!

O Larápio

Arrancava de mim todos os quandos:
a base era buraco, o teto era asa
e tudo em brasas se me convergia
líquidos, como lavas, derramando
dentro às veias do corpo em todo quando.

Arrancava de mim toda energia:
do trabalho; da essência, até do sono
como se fosse o dono desta casa
erguida de imatura alvenaria
duma assaz construção desta energia.

Arrancava de mim toda atenção:
os pássaros; a cor – era o gatuno,
um sentimento uno de magia;
uma alquimia para o coração
que convergia em si, toda atenção...

Arranca, pois, Larápio, tudo é teu!
os devaneios; pensamentos, risos
a loucura, o juízo, a poesia!...
E faze acreditar que não morreu
o eu que havia em mim, quando fui teu...

Entre Sonho

Sonhava dizer-te adeus neste dia:
O sol despontava fulvo lá fora
De luz e calor tua graça se ungia,
– Que linda, perfeita, a minha senhora!

Não pude mentir-te enquanto bem via
Descendo as escadas, naquela hora,
Tomada de sol, vestida de aurora
Meu peito pulava e amor eu sentia.

E o quanto eu sentia! E quanto te olhava!
Sentia e olhava. Olhava e sentia
A dor que causava quando eu dizia:

“– Estou indo embora. Adeus, ó Senhora
Tomada de sol, vestida de aurora!”
E enquanto eu partia, o peito pulava...

E então despertava. E a aurora nascia!...
Parida em teu rosto; untando os cabelos:

“– Se adeus te dissesse, Ó minha senhora
Serias tu, sonho, e eu só... pesadelo!...”

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Espumas II

Qual fonte da amplidão e brota de friagem;
Da alvura luxuosa e alegre sendo a fronte
Vê-se parir na areia, advindas do horizonte,
As vagas, suas crianças, mães da paisagem:

Atônitos, honrando-a, as lapas mais os montes
de almiscarado brilho, esplende esta miragem:
Na falda um verde-cré alvíssimo interage
Mesmo antes que alvorada ao píncaro desponte...

E lá se vêm felizes, doudas, a mancheias,
trazendo a maresia, estando uma por uma,
dispersas pela vaga; estendidas na areia.

Sentado, da colina, escrevendo das frondes
Um colossal sorriso eu largo a olhar espumas:
as crianças do mar brincando um pique-esconde...

domingo, 16 de janeiro de 2011

Entre Chuvas e Ninos

Lá fora a chuva tenra nos ninava.
Em nosso leito, mais de ti sentia
O teu sorriso, a tua alegria!
Adormecias. Teu sonho eu sonhava.

Sonhava! E em teu cabelo agrisalhava
O negro jovial que amei um dia,
Lembrava que fitando-te eu sorria,
E quanto mais sorrindo, eu te lembrava...

Tudo passou! Mas quando a chuva canta
Mesmo que solitário no meu leito
Uma lembrança indene se agiganta:

O meu sorriso mágico e um nino;
A alvura das madeixas no meu peito;
O dia cinza. O amor. Tu... e um menino...

Som dos Sinos

Por mil caminhos vadiando torto,
de calejado passo, o pé franzino
se doravante, mais parece morto;
se preso à senda que passou, mofino...

Mas eis que ao solto andejo, só e absorto,
junto ao meu passo, tilintando sinos,
ouço do amor e dos seus sons, conforto,
no interior como brincasse um nino...

Vi-a sentada. Seu olhar fincado
no meu olhar, cá dentro ouvi bramindo
esta algazarra angelical benquista!

– Qual é seu nome, ó Carrilhão soado?
Interroguei-lhe adentro, já sorrindo:
– Chamam-me amor... quando à primeira vista!