quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Do Lábaro Azul



Por sob olhar queimoso do astro-rei
coser todo suor que toma a leira,
dos que da terra adoram, na bandeira,
tal como um povo unido fosse lei.

Tingir, seja o plebeu ou seja o rei,
rainha ou tal a simples costureira
assim como atingisse a cor certeira,
num pano, todo orgulho de uma grei.

Fazer estremecer da haste a certeza
que as brisas trazem sonhos agoureiros
e tempos alvos nesta amareleza...

Contar vinte uma estrelas por aí
E ter certeza, todo brasileiro,
que há céu desde Oiapoque até o Chuí!

Cirurgia

Deitado nesta cama de doentes
um medo me resvala impetuoso.
Quisera eu ser de um mundo mais ditoso,
Pacífico, impoluto e quiescente!

Agora, em meio a tanto entorpecente,
profiro um credo, um rogo desejoso
de quando, como agora, desgostoso
sombrio eu era, ainda adolescente:

"– Venha buscar-me, ó Morte! Venha logo!"
Um choramingo eu ouço quando a rogo
deitado no meu leito, exausto e laxo.

Empunha um bisturi, começa o corte:
numa explosão de brilhos sinto a morte,
como gota escorrendo foice abaixo...

Para Sempre

Fiquemos sós, querida.
Eu menos tu. Só de ti, só de nós.

Fiquemos livres, vivos! Fiquemos contidos nas nossas almas.
Deixemos que o corpo – templo da ignorância e da farta burriquice – aprenda, sozinho, como se morto inda existisse.

Fiquemos soltos e alados;
sossegados, perdidos ao hálito do vento,
que um torvelinho, no templo, se nos lembrará.

Fiquemos sós, querida.
E num próximo encontro, menos terno
o gozo que teu corpo me herdas,
num gemido silente, terás por eterno.

Nossas almas, completas de nós, serão a Natureza.
E do corpo, a torvelinhos, se ouvirão os uivos, se ficarmos sós.

Fiquemos sós, querida.
Para sempre.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Dos Peixes

Furtam meus olhos pelos seus trejeitos
O Olhudo, O Aquarela e O Nemo-velho.
Planam pelo aquário me chamando,
pousam suas barbatanas no escafandro
que lhes renova todo oxigênio.

Admirado, levo as mãos ao vidro,
(assim minha alma é, quando mostrada?)
não fogem, não se movem, ficam lindos!
E eu lembro a velha solidão que me enche
quando digo um olá e ouço três nadas...

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O Acaso

Uma poeira presa
à quina da parede.
Passeia distraído
um cachorro ao seu lado.

O acaso é este cachorro
de poeira se enchendo.
É a transformação
de um destino ocorrendo.

Modifica-o com o tempo,
e o tira a origem, cor,
é o que o acaso faz!
(pro estímulo ou langor)

A poeira – o destino;
Nasceu sem liberdade!
O acaso torna fado
outras mil realidades.

E se eu fosse liberto
veria os seus sinais
sutis, que modificam
a minha vida inteira?

Não sei. Sou desligado
ao que vem na dianteira.
Não nasci pra cachorro,
mas sei: serei poeira...